lunes, 30 de octubre de 2023

LOS AMIGOS DE ALBA - jorge peres - 80

 

                                    OS AMIGOS DE ALBA !



    O silêncio reinava naquele quarto …

    Na cama de cima, de um beliche de madeira, uma menina de nove anos, dormia tranquilamente … é ALBA … e está muito bem acompanhada pelos seus amigos …

    Aproveito para fazer as devidas apresentações …



         -- GATITO – o eleito --- o mais velho de todos … chegou à vida da menina quando ela não tinha mais do que um ano de idade … dormia ao seu lado … todas as noites …




         -- SIREGATA – a tímida --- muito introvertida … uma mistura de gata e sereia … é muito simpática, ainda que não fale muito …



         -- JEFE – o manda chuva --- o mais conflituoso de todos … considera-se o mais esperto de todos … implica com especial incidência com GATITO …



         -- UNICORNI – o amigável --- positivo por natureza … sempre deitando água no fogo … sempre tentando que todos se deem bem …



         -- FOQUITA – a invisível --- se SIREGATA fala pouco, esta não fala nada … um problema grave nas cordas vocais fez com que ela ficasse totalmente muda … era, literalmente, invisível no meio do grupo …



         -- CONEJITO – o corre mundos --- intrinsecamente elétrico … não pára um segundo … sempre movendo-se para um e outro lado … parece que não se cansa … nunca …



        -- GORJUSS – a justiceira --- séria … meio reservada … a mais ponderada de todos … a ela recorrem para solucionar os conflitos … é ouvida … respeitada …


    Aparentemente, só são peluches … mas … poucos sabem … quando se fecha a porta do quarto … os bonecos … ganham vida … …


        Aquela noite parecia ser diferente das demais … tranquila … reparadora …

    Foi CONEJITO … a quem nem a noite parava … quem deu a voz de alarme …

    --- Companheiros ! Companheiros ! Acordem !!!

    Pouco a pouco todos se foram aproximando …

    No chão estava GATITO … não se mexia …

    --- Que aconteceu ?!!? --- UNICORNI ajoelhou-se ao pé do corpo --- GATITO ! GATITO ! Acorda !!!

    Mas … continuava imóbil …

    SIREGATA soltou um grito …

    --- Está morto !!

    Instintivamente, todos olharam para JEFE …

    --- O que se passa ?! Porque olham para mim ?!!?

    --- Esta tarde discutiste com ele --- CONEJITO olhava-o com ar acusatório … --- Também discuti contigo … e aí estás … correndo de uma lado para o outro … como um tonto !!!

    --- A quem estás a chamar “tonto” … imbecil ?!!

--- Calma … os dois … --- UNICORNI, como sempre, tentava tranquilizar o ambiente …




        -- GORJUSS – a justiceira --- séria … meio reservada … a mais ponderada de todos … a ela recorrem para solucionar os conflitos … é ouvida … respeitada …


        Aparentemente, só são peluches … mas … poucos sabem … quando se fecha a porta do quarto … os bonecos … ganham vida … …


        Aquela noite parecia ser diferente das demais … tranquila … reparadora …

        Foi CONEJITO … a quem nem a noite parava … quem deu a voz de alarme …

        --- Companheiros ! Companheiros ! Acordem !!!

        Pouco a pouco todos se foram aproximando …

        No chão estava GATITO … não se mexia …

        --- Que aconteceu ?!!? --- UNICORNI ajoelhou-se ao pé do corpo --- GATITO ! GATITO ! Acorda !!!

        Mas … continuava imóbil …

        SIREGATA soltou um grito …

        --- Está morto !!

        Instintivamente, todos olharam para JEFE …

          --- O que se passa ?! Porque olham para mim ?!!?

        --- Esta tarde discutiste com ele --- CONEJITO olhava-o com ar acusatório … --- Também discuti contigo … e aí estás … correndo de uma lado para o outro … como um tonto !!!

        --- A quem estás a chamar “tonto” … imbecil ?!!

        --- Calma … os dois … --- UNICORNI, como sempre, tentava tranquilizar o ambiente …




        Mas agora, a situação era diferente … todos a olhavam enquanto ela abria a janela … para baixo … 13 andares … em queda livre …

        --- Parem ! --- a voz firme e segura de GORJUSS fez voltar o silêncio --- O que estão a fazer ?!

        --- JEFE matou a GATITO ! --- CONEJITO … continuava a pressionar …

        --- Têm provas ?!!? Algum de vocês viu o acto ?!!? --- todos olharam para o chão … ninguém respondeu --- E tu, ALBA ?! O que pensas de tudo isto ?!!?

        Mas ALBA, chorando e muito triste, também não respondeu … continuava a olhar para o peluche …

        GORJUSS aproximou-se de JEFE …

        --- E tu ?!!? Não dizes nada ?!!? Mataste a GATITO ?!!?

        --- Não! Estava a dormir ! Foi CONEJITO quem me acordou … gritando … mais ! Ele era o único que estava acordado … poderia tê-lo morto ele … !!

        --- Calma, companheiros ! … De nada nos serve repartir acusações … --- UNICORNI sempre tentava baixar os ânimos …

        FOQUITA aproximou-se de ALBA … abraçou-a … se lhe via um ar triste … a ela, GATITO caia-lhe muito bem …

        --- A verdade é que não podemos determinar, com certeza, quem o matou … aqui não há câmaras … a única solução é que o culpado confesse …

        Deu um passo e colocou-se em frente de SIREGATA … depois de uns breves instantes … reagiu …

        --- Quem ?! Eu ?!!? Eu não tinha nada contra GATITO … todos sabem que nos dávamos bem …

        Com muita tranquilidade GORJUSS deu um pequeno passo … parou em frente de JEFE …

        --- Já disse !! Eu não o matei !

        Um a um, GORJUSS enfrentava os presentes … um a um … era a vez de UNICORNI …

        --- Não ! Não fui eu ! Claro que não !

        FOQUITA continuava abraçada com ALBA … e CONEJITO, como sempre, saltava de um lado para o outro …

        --- Pára … CONEJITO ! … Assim mais pareces um culpado !

        O peluche parou de repente …

        --- GORJUSS … eu não poderia matar a ninguém …

        Não aguentando mais, ALBA apanhou o corpo de GATITO e abraçou-o nos seus braços ….

        Então … para surpresa de todos … GATITO abriu os olhos …

        --- O que se passa ?!!? Porque olhais assim todos para mim ?!!?

        --- GATITO ! GATITO ! Estás vivo !?! --- ALBA gritava de alegria …

     --- Claro que estou vivo ! Porque não ?!!? Estava dormindo profundamente !

        ALBA apertava-o carinhosamente …




        --- Penso que devem, todos, um pedido de desculpas a JEFE … todos ! --- GORJUSS falava num tom sério …

        UNICORNI foi o primeiro …

        --- Desculpa JEFE … no fundo eu sabia que não podias ser tu …

        --- Perdão, JEFE, não tenho palavras --- SIREGATA tinha uma voz envergonhada …

        --- Desta vez és inocente … mas isso não limpa as vezes que te portaste mal comigo … --- CONEJITO estava ressentido …

        ALBA fez um sinal a JEFE, convidando-o a sentar-se nos seus joelhos …

        Ele aceitou sem pensar duas vezes …

        ---- Talvez eu tenha sido injusta contigo … com todos vocês … GATITO acompanha-me desde sempre, dorme comigo todas as noites … por isso o chamais de “O ELEITO” … pois … a partir de hoje, um de vocês me acompanhará … a mim e a GATITO … faremos uma escala … esta noite vais a ser tu, JEFE … estás de acordo ?!1

        --- Claro que sim, ALBA …

        A menina subiu à sua cama.

        --- Vem ! Sobe !

        Pouco depois, ALBA voltava a dormir … desta vez com dois peluches … um de cada lado…

        --- Cuidado ! Vem alguém ! --- sussurrou CONEJITO …

        Muito lentamente a porta do quarto foi-se abrindo.

        Fazendo o mínimo barulho possível, a mãe de ALBA entrou … confirmou que a sua filha dormia … olhou o chão … os peluches estavam todos aí … todos menos dois …

        A CONEJITO e a FOQUITA, deixou-os na pequena mesa de trabalho de ALBA … a UNICORNI, devolveu-o à estante … a SIREGATA e a GORJUSS o destino foi a caixa de brinquedos …

        Fechou a janela … da mesma maneira silenciosa como entrou … assim saiu do quarto …

        ALBA dormia … 

                                        ALBA … e os seus amigos …



                                                            fim


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sábado, 21 de octubre de 2023

A ESTUPIDEZ DE UMA GUERRA - 79

 


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                                    A ESTUPIDEZ DE UMA GUERRA



    --- Pelotão ! Sentido !

    O grupo de 20 homens formavam perfilados diante do homem graduado …

    --- Soldados … Iván Rodríguez … Carlo Leandro … Josemar Corredano … saiam da formatura e ponham-se à minha frente …

    Os três homens saíram correndo e ficaram numa completa vertical diante do capitão …

    --- Os outros ireis para os vossos postos de ocupação … Pelotão ! Destrozar !

    Todos abandonaram a parada, menos os três que tinham sido chamados …

    --- Você, venham comigo …

    Seguiram-no por entre os edifícios do aquartelamento …

    --- Capitão Santristán !

    --- Diga-me, soldado …

    --- Donde nos leva ?!

    --- Não seja tão curioso, soldado … A seu tempo saberá …

    Entraram no edifício de comando, num salão onde já se encontravam outros dois militares …

    O capitão apresentou-os …

    --- Estes são … o soldado Eliseu Ramirez e o sargento Rolando Cortez …

    Poucos minutos depois entrou outro homem … com mais idade … e mais medalhas … o capitão reagiu de imediato …

    --- Atenção ! Sentido !Entra o general Juan del Castillo …

    O silêncio caiu de golpe … só interrompido pelo som das pesadas botas do militar …

    --- Tranquilos … à vontade … temos que falar de coisas muito sérias … venham … sentemo-nos nessa mesa … aí falaremos melhor …

    Carlo olhou à sua volta … fosse o que fosse … parecia ser importante …

    O general sentou-se na frente de algumas pastas …

    --- Senhores ! Tenho aqui os vossos expedientes … necessito-vos … o país os necessita … Capitão … ponha-os ao corrente da situação presente …

    O capitão levantou-se …

    --- Com licença, general … Companheiros … sei que sentem muita honra e orgulho, como eu, de pertencer ao exército de Estraduz … somos o baluarte da existência tranquila e independente do nosso país … --- bebeu um pouco de água e continuou --- Como sabem, a actual situação política é tudo menos tranquila … há assassinatos todos os días … ministros que não chegam nem a aquecer o lugar … não há estabilidade … isto está insustentável … por isso, e de uma maneira mais que compreensível, alguns companheiros, amantes da nossa pátria, decidiram revoltar-se … organizaram um golpe estado …

    Carlo era, sem dúvida, o mais participativo … levantou a mão …

    --- Diga, soldado !

   --- Somente uma pergunta … o governo que está neste momento, não saiu das votações das últimas eleições ?!!

    General e capitão olharam-se … o primeiro respondeu …

    --- Tecnicamente … sim … ainda que se possa pôr em causa a legalidade de este acto eleitoral …

    O capitão lançou a Carlo um olhar de preocupação … e crítica …

    --- Respondeu o general à sua pergunta, soldado ?!

    --- Sim, meu capitão ! Totalmente !

    O general abriu um mapa.

    --- Senhores … a ideia é fazer convergir tropas, de todos os pontos do país, à volta da capital, Carod … --- com o dedo mostrava a grande cidade, situada quase no centro do país …

    --- Neste momento, Carod, encontra-se já cercada … mas estamos encontrando mais resistência do que esperávamos … por isso … pensamos utilizar um método diferente …

    Os presentes ouviam com atenção … o general depois de uma breve pausa, continuou …

    --- Vamos criar um grupo de comandos operacionais, para cumprir algumas tarefas, diminuindo o risco e minimizando ao máximo a perda de vidas inocentes … vocês serão um desses grupos …

    Olharam-se entre eles …

    --- Posso perguntar algo, meu general ?!

    --- Claro que não !!! --- quem respondeu foi o capitão … imediatamente foi cortado pelo homem de maior patente …

    --- Capitão Fran de Santristán … estes homens vão arriscar as suas vidas … o mínimo que podemos fazer é ouvi-los … pergunte, soldado … como se chama ?!

    --- Sou o soldado Carlo Leandro, meu general … compreendo tudo o que nos disse … mas … porque nós ?!!?

    --- Esperava essa pergunta, soldado Carlo … vou-lhe responder com sinceridade … vocês os cinco foram escolhidos porque, de uma maneira ou outra, tiveram contacto directo com a capital … conhecem-na bem … ao menos são as informações que eu tenho aquí nos expedientes … mas gostava de confirmar … … comecemos por si, soldado Carlo … que tipo de ligação tem com Carod ?!

    --- Não nasci em Carod, mas toda a minha família vive aí …

    O general olhou para o militar que estava sentado ao lado …

    --- Eu sou o soldado Josemar Coredano … vivi em Carod até aos meus 16 anos … depois, os meus pais separaram-se … eu e a minha mãe fomos viver para o sul …

    --- Seguinte …

    --- Eu sou Eliseu Rodrigues, soldado … também não nasci em Carod … mas vivi aí os últimos 10 anos …

    --- Eu sou Ivan Rodriguez, soldado … a minha mãe é da capital, e vive aí … visito-a muitas vezes …

    --- Eu sou Rolland Cortez, primeiro sargento … antes de entrar na vida militar estudei em Carod …

    --- Posso fazer mais uma pergunta geral ?!

    --- Claro que sim, soldado Carod … diga-me …

    --- Esta convocatória é de carácter obrigatório, não é verdade ?!

    O general fez um ar sério …

    --- Não, soldado … se não se sente integrado neste grupo … pode retirar-se …

    O soldado baixou a cabeça … depois de alguns segundos, falou …

    --- Eu fico … podem contar comigo …

    --- Pois já está … cavalheiros … partimos esta noite para Carod … amanhã, já aí, vos será comunicada a vossa missão … podem retirar-se …

    Levantaram-se ao mesmo tempo, fizeram a continência e saíram … não falaram entre eles …


                                                           ------- // -------


    Entraram na capital quando começava a sair o sol … permitiram-lhes descansar …

    Pelas 18 horas foram chamados a uma reunião … esperava-os o capitão …

    --- Senhores … aqui e agora, tomaréis conhecimento do que se espera de vocês …

    Todos estavam expectantes …

    --- Serão os efectivos da operação Bisturi … sabemos que os defensores do regime estão bem organizados … os nossos serviços de inteligência passaram-nos a informação de um dos seus locais de reunião … está na rua de Alperá, número 27 … todos conheceis essa rua … não é verdade ?!

    Todos fizeram, em silêncio, um movimento afirmativo com a cabeça …

    --- É necessário ir aí … esta noite … surpreendê-los …

    Um momento de pausa e o capitão continuou …

    --- Não queremos sobreviventes … compreendem a missão ?! Alguma pergunta ?!

Carlo levantou a mão …

    --- Diga … soldado … --- a voz era já mais ríspida …

    --- Que acontecerá se algo sai mal ?!

    --- Nada pode correr mal …

    --- E se nos descobrem ?!!

    -- Se o fazeis bem … não vos descobrirão …

    --- E se nos capturam ?!!?

    --- Soldado ! Já basta ! É uma missão ultra-secreta … se os capturam, não poderemos fazer nada desde aqui …

    --- Ou seja … que …

    --- Estão por vossa conta …

    O tom de voz do capitão ia perdendo a sua pouca simpatia natural … no final, de novo, silêncio … pesado …

        A noite chegou lenta … o tempo estava espesso …

        Finalmente fizeram-nos subir a um camião … a viagem foi rápida …

       O capitão aproximou-se …

--- Senhores ! Até aqui podemos chegar … Carod está a cinco quilómetros … muita sorte … Sargento Cortez ?!

    --- Si, capitán …

    --- Traga-me estes homens de volta … vivos …

    --- Deixarei a minha vida nesse objetivo, capitão !

    Com uniformes negros … pasa montanhas e capacete tambén negros … cargados com uma metralhadora com silenciador … uma pistola Lugger … uma faca de sobrevivência … um cantil com água … três granadas de mão …

    Ainda que fosse um grande conhecedor da cidade, o sargento tinha um mapa … nele estavam sinalizados alguns pontos de controle dos governamentais … mas podia não estar actualizado …

    Até as primeiras casas avançaram com alguma rapidez … depois … o cuidado foi redobrado … a velocidade reduziu-se para menos de metade …

    Conheciam bem a rua de Aperá … uma das mais comprimidas da capital …

    Estavam a uns 200 metros do número 27 … de repente o sargento levantou o punho direito … sabiam o que significava … pararam todos … inclinados … rente ao chão … camuflados com as sombras da já escura noite …

    Um veículo militar avançava lento pela rua … passou a poucos metros deles …

    Uns minutos depois o graduado fez sinal para avançar …

    O número 27 era uma casa que aparentava normalidade … tinha dois andares … construção antiga … porta de madeira escura …

    Ivan era o experto em fechaduras … ninguém sabia a que se dedicava antes de entrar na vida militar …

    Era bom … em dois minutos ouviu-se um “click” … a porta estava aberta …

    O sargento foi o primeiro a entrar …

    Ouviam-se vozes … uma nesga de luz escapava-se por baixo da porta da sala …

    --- Preparem-se … tentem antecipar-se a qualquer disparo deles … não queremos chamar a atenção …

    Num movimento rápido abriu a porta … Ivan, Josemar e Eliseu entraram rápidos e começaram a disparar …

    Sentados à volta de uma mesa foram caindo … um a um …

    Não houve tentativas de defesa …

    Em segundos havia 5 corpos no chão … um deles era o de uma mulher …

    Esperavam encontrar mapas … papéis … planos … … mas só havia pratos e copos … estavam a jantar …

    --- Carlo !

    --- Sim, sargento !

    --- Confirme se há alguém no andar de cima !

    --- Sim, sargento !

    Subiu as escadas sem fazer ruído …

    Encontrou três quartos … todos estavam vazios !

    Preparava-se para abandonar o último … algo chamou a sua atenção …

    A colcha da cama … juraria que a tinha visto mexer …

    Preparou a metralhadora e, suavemente, aproximou-se rapidamente levantou uma ponta …

    O que viu cortou-lhe a respiração …

    Apareceu a cabeça de uma menina … não mais de cinco anos … olhos de um azul esverdeado … mas … inundados de pânico …

    Carlo afastou a arma … tentou sorrir-lhe …

    --- Carlo ! Tudo bem aí em cima ?!

    --- Sim, sargento … tudo vazio !!

    Voltou a olhar a menina … levou o dedo indicador aos lábios … falou-lhe em voz baixa …

    --- Shhiuuu ! Não saias daí !

    Olhou à sua volta … viu, numa pequena mesa um saco de pipocas … levou-a para baixo …

    Os outros olharam para ele …

    --- Tomem ! Estão boas …

    --- Soldados ! Isto ainda não está terminado … temos que regressar …

    Tal como a ida, a volta foi cautelosa … em silêncio …

    Carlo revia aqueles olhos verdes … muito abertos … alguma coisa, em tudo aquilo não encaixava …

    Chegaram ao ponto de partida quase três horas depois …

    O capitão Santristán estava à espera deles … com ele um general que não conheciam …

    --- Sargento Roland Cortez … informe da situação …

    --- Operação Bisturi concluída com êxito total, meu capitão … cinco inimigos abatidos … o número 27 da rua de Alperá está limpo … …

    --- Muito bem, sargento …

    --- Capitán !

    --- Sim, meu general !

    --- Ouvi dizer … número 27 da rua de Alperá ?

    --- Assim é, meu general … o objetivo da Operação Bisturi !

       O mais graduado olhou para ele fixamente … depois abriu uma das pastas que tinha em cima da mesa … mostrou-lhe …

        O capitão ficou branco …

        Todos compreenderam que se passava algo …

       Carlo furou todo o protocolo militar … avançou e antes que os graduados pudessem reagir, pegou na pasta … … depois deixou-a cair em cima da mesa … deu meia volta e, sem pedir autorização, saiu da enorme tenda de comando …

    Não podia conter as lágrimas … gotas de raiva … de desespero …

    Naquela pasta estavam os planos da “Operação Bisturi” … e o objetivo … “ Rua de Alperá … número 29 “ …


                                                                ------- // -------


    Carlo olhava pela janela daquele 34º andar, bem no centro de Carod …

    Pensava muito na noite daquela fatídica operação militar … já tinham passado quase 20 anos …

    Agora, ele era um executivo de uma importante empresa de informática …

    Abandonara a vida militar logo depois do golpe … esse golpe em que havia participado “involuntariamente” … a situação apanhou-o em pleno serviço militar obrigatório … não tivera outra opcção …

        Mas depois de tudo terminado … e de uma promoção, que recusou … sabia que os seus dias de uniforme terminariam quando se esgotassem os 24 meses de SMO …

        Não voltou a encontrar-se com nenhum dos seus companheiros de missão …

        O som do intercomunicador despertou-o dos seus pensamentos …

        --- Senhor Leandro ?! --- era a voz da sua secretária --- sim, Luisa, diga-me …

        --- Está na recepção uma mulher que diz que quer falar com o senhor !

       --- E quem é ?! Como se chama ?!!

        --- Almudena López .

        Carlo pensou um pouco … mas aquele nome não lhe dizia nada …

        --- Que suba !

        Pouco depois alguém bateu, suavemente, com os dedos na porta do seu escritório …

       --- Entre !

        Entrou uma mulher loira … bem parecida … mas desconhecida …

        --- Carlo Leandro ?!

        Levantou-se educadamente …

      --- Conhecemo-nos ?!

        --- Sim, Carlo …

        Olhou para ela mais atentamente … bonita … atractiva … e os olhos … os olhos … ficou sem palavras … uns olhos azuis esverdeados … sim … ele já tinha visto aqueles olhos … …

    --- Tu … es !! …

    --- Sim … sou a menina a quem salvaste a vida, naquela noite …

    Carlo emocionou-se de novo ao voltar a reviver a operação Bisturi … as lágrimas saltaram … como há vinte anos atrás …

    Aproximou-se dela …

    --- Perdoa-me …

    --- Salvaste-me a vida … estou-te muito agradecida …

    --- Eu fiz parte do grupo que matou os teus pais e irmãos …

    Agora foram os olhos dela que se inundaram …

    --- Posso fazer-te uma pergunta, Carlo ?!

    --- Todas, Almudena … assim te chamas, não é verdade ?!

    Sim. Tu disparaste contra a minha família ?

    --- Não ! Nessa noite não disparei um único tiro …

    --- Era o que eu imaginava … foi difícil encontrar-te … levo quatro anos tentando chegar até a ti …

    --- Deixei o exército assim o que me foi possível … aquela noite persegue-me … até hoje … vejo os teus olhos todos os dias … antes de dormir …

    Ficaram uns momentos em silêncio … ele foi o primeiro a falar …

    --- Posso dar-te um abraço ?!!

    --- Claro que sim !

    Fundiram-se num abraço apertado … tentando controlar a emoção … era doloroso reviver tudo aquilo … a estupidez de uma guerra … de qualquer guerra …


                                                            fim ( quase )



    Enquanto investigava para o livro, “ ECOS … EN EL SILENCIO … “ chegaram-me muitas histórias … esta em concreto …

    Foi-me contada, tendo como cenário, Madrid, e um determinado número da “ Calle de Alcalá “ …

    Segundo o que alguém me contou, este episódio aconteceu na primeira tentativa de Francisco Franco em tomar a capital, em 1936 …

    A história sensibilizou-me enormemente … mas não a consegui contrastar com outras fontes … não pude confirmar a sua veracidade …

    No entanto não quis deixar de contar-vos esta terrível história … passada hipoteticamente num país de ficção … em cidades e ruas inexistentes …

    No fundo, o menos importante é o local … o relato espelha, muito concrectamente, os horrores de qualquer guerra …



                                                                            fim ( agora sim )





O FIM ... OU ... O PRINCÍPIO ?! - jorge peres - 81

                                  O FIM … OU O PRINCÍPIO …      Fechei um dos olhos … com o outro tentei alinhar a pistola c...